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Avanços e desafios da COP29: o que esperar para o futuro?

02/12/2024 17:47
Avanços e desafios da COP29: o que esperar para o futuro?

A COP29, realizada em Baku, capital do Azerbaijão, chegou ao fim após duas semanas – que se estenderam dois dias além do esperado. O evento reuniu representantes de Estados e da sociedade civil de todo o planeta para discutir caminhos de combate ao aquecimento global.

Esta edição ficou especialmente marcada pelas discussões sobre o financiamento climático. Assim sendo, a “COP do Financiamento”, como passou a ser chamada informalmente, buscou soluções para viabilizar o aporte financeiro de países desenvolvidos a iniciativas ambientais nas nações em desenvolvimento.

Quais foram os principais acordos firmados nesta COP29 e quais avanços eles representam? Quais as perspectivas de ação climática após este congresso? Confira neste texto detalhes sobre o presente e o futuro dos planos globais e nacionais.

Novo acordo por financiamento climático

Os países deixam a COP29 com a certeza de um avanço e de um impasse em relação ao financiamento climático: chegou-se a um acordo que elevou a quantia anual investida pelos países desenvolvidos, mas ainda há uma divergência grande entre o que as nações em diferentes blocos desejam.

As negociações sobre financiamento climático estiveram travadas durante a primeira semana da COP, esperando o andamento do G20, reunião entre os representantes das maiores economias do mundo que ocorreu no Rio de Janeiro. A cúpula sinalizou que um acordo no Azerbaijão era necessário e citou especificamente que as quantias saltassem dos bilhões aos trilhões de dólares.

Uma Nova Meta Quantificada Coletiva (NCQG, sigla em inglês) foi traçada em Baku. Desse modo, os países desenvolvidos signatários do Acordo de Paris passam a ter como meta colaborar ao financiamento climático com U$ 300 bilhões anuais a partir de 2025, com a ambição de alcançar U$ 1,3 trilhão até 2035.

Posicionamento do Brasil

A contribuição cresceu, tendo em vista que a meta anual anterior era de U$ 100 bilhões. Entretanto, a urgência de ações para conter o aquecimento global faz com que países em desenvolvimento, incluindo o Brasil, não considerem esse aumento suficiente. O grupo demanda U$ 1,3 trilhão por ano como base da meta.

A responsabilidade do financiamento climático fica a cargo dos países desenvolvidos tendo em vista que, historicamente, são os principais responsáveis pelo aumento nas emissões de gases do efeito estufa. “Não é caridade, é 100% do interesse de todas as nações, para proteger suas economias e seu povo dos desenfreados impactos climáticos”, ressaltou Simon Stiell, secretário executivo da ONU, em discurso durante as negociações.

Há, ainda, a questão sobre como os recursos chegarão aos países em desenvolvimento. A NCQG não é específica, mencionando que eles podem ser provenientes de diversas fontes públicas ou privadas, bilaterais ou multilaterais. No “Roteiro Baku a Belém para 1,3T” – uma cartilha visando colocar a meta em prática –, menciona-se a prioridade a recursos não reembolsáveis e instrumentos concessionais que não gerem endividamento.

Suficiente ou não, um acordo sobre o financiamento climático está, afinal, estabelecido. O próximo passo é que os países elaborem suas novas NDCs (sigla em inglês para Contribuição Nacionalmente Determinada) com base no novo orçamento e divulguem-as até fevereiro de 2025, estabelecendo metas mais ambiciosas para frear o aquecimento global.

Criação do mercado internacional de carbono

A COP29 foi cenário de avanço em uma pauta que estava travada há algumas edições da conferência: o estabelecimento de um mercado internacional de créditos de carbono. Enquanto as discussões sobre financiamento climático aguardavam posicionamento do G20, a presidência da COP29 rapidamente propôs essa pauta e alcançou resoluções.

Os países entraram em acordo pela criação de um mercado voluntário, que deve ser implementado em 2025. O Supervisory Body Mechanism (SBM) será responsável por gerenciá-lo. O mecanismo estabelecido no Artigo 6.4 do Acordo de Paris gerará os créditos comercializados por instituições privadas e públicas. O órgão detalhará posteriormente quais tipos de projetos poderão operar no mercado internacional.

O Artigo 6.2, também ‘destravado’ na COP29, regula acordos bilaterais entre nações. Dessa maneira, grandes emissores de carbono poderão alcançar suas NDCs através da compra de créditos com países que excedem suas próprias metas.

O mercado de carbono é uma aposta forte da ONU para viabilizar o financiamento climático. O órgão internacional prevê que ele possa movimentar U$ 1 trilhão por ano até 2050, e que possui capacidade de reduzir em até U$ 250 bilhões o custo para a implementação de iniciativas ambientais.

Transição energética precisará de mais debates

Tópico essencial para que a ação climática tenha resultados efetivos, a transição energética não avançou de maneira significativa durante a COP29. Depois de congresso histórico no ano anterior, que pela primeira vez reconheceu a necessidade de promover transição para além dos combustíveis fósseis, a NCQG deste ano não repetiu a menção.

O Azerbaijão, portanto, não foi terreno fértil para debates de transição energética, e parte disso pode ser atribuída a seus próprios interesses. O petróleo é o principal produto de exportação da economia azeri. Ilham Aliyev, presidente do país, classificou o combustível fóssil como um “presente de Deus”, e que as nações não devem ser penalizadas por possuí-lo ou disponibilizá-lo no mercado internacional.

O Brasil levou a pauta ao Azerbaijão. O Governo Federal apresentou na COP29 o Pacto Energético da ONU, documento consolidado com base na reunião entre ministros de energia do G20 realizada em outubro. O texto traz compromissos visando aumentar a segurança energética e promover uma reformulação justa.

Para que a transição energética avance no ritmo necessário para a mitigação da crise climática, países como o Brasil terão de assumir posição de liderança. A nação terá uma grande oportunidade para cumprir tal papel em 2025, quando sediará a COP30, em Belém. Costurar acordos internacionais é um caminho essencial para esse progresso tão necessário.

Como o Brasil se portou na COP29

Para além de apresentar o pacto energético, o Brasil foi participante ativo na COP29. O país se destacou ao ser o primeiro membro do G20 a apresentar sua nova NDC, traçando metas para redução das emissões de carbono até 2035. As nações deverão divulgar suas intenções até fevereiro de 2025.

No documento, o Brasil se comprometeu a reduzir suas emissões de gases do efeito estufa entre 59% e 67% até 2035, na comparação com os níveis de 2005. Metas setoriais ainda serão definidas no Plano Clima, com elaboração prevista para o ano que vem. Assim sendo, o objetivo final segue sendo alcançar a neutralidade climática até 2050.

Assinatura de tratado internacional

O Brasil foi um dos 35 signatários iniciais da Declaração de Redução de Metano de Resíduos Orgânicos, um tratado internacional que reúne os responsáveis por 47% das emissões de metano no planeta. A substância, proveniente de fontes como resíduos da pecuária, colabora para a intensificação do efeito estufa.

Os países que assinaram o tratado se comprometem a colocar metas setoriais para diminuição das emissões de metano em suas NDCs. O pacto internacional visa fortalecer o Compromisso Global do Metano, lançado na COP26, no qual estabeleceu-se a meta de reduzir as emissões em 30% até 2030, na comparação com 2020.

COP29 acelera discussões sobre mercado de carbono nacional

Enquanto o mercado internacional de créditos de carbono enfim sairá do papel após a COP29, o Brasil progrediu simultaneamente em seu mercado nacional. O Senado e a Câmara aproveitaram o momento de destaque à pauta para votar e aprovar a PL 182/2024, que agora aguarda somente sanção presidencial para se tornar lei e posterior regulamentação pelo Poder Executivo.

O modelo proposto no projeto prevê que atividades com emissões superiores a 10 mil toneladas de CO2 por ano deverão enviar plano de monitoramento ao órgão regulador, e empresas ou pessoas físicas com emissões acima de 25 mil toneladas de CO2 ficam sujeitas a sanções e multas. Já as organizações que capturam ou neutralizam carbono podem rentabilizar suas iniciativas verdes.

Projetos sustentáveis além da COP29

O ano de 2024 está sendo marcado pelo lançamento de projetos governamentais que buscam atrair investimentos e viabilizar o financiamento climático a nível nacional.

Um desses projetos é o Eco Invest Brasil. O programa de proteção cambial visa captar investimentos privados externos para apoiar a transformação ecológica. Entre suas estratégias está, por exemplo, o blended finance – uso de recursos públicos para reduzir custos de empréstimo – e a liquidez para empresas – suporte financeiro durante dificuldades cambiais.

Outro projeto, este ainda a ser lançado, é a taxonomia sustentável brasileira. A iniciativa foi criada para classificar atividades econômicas de acordo com seu impacto ambiental. Ao definir métricas e considerar objetivos ecológicos e sociais, tem como objetivo descarbonizar o setor produtivo. A primeira versão do documento está prevista para o fim deste ano.

Há também o trabalho para aprimorar projetos já existentes. O Fundo Clima, administrado pelo BNDES, atua no financiamento de projetos de mitigação da mudança climática e dos seus efeitos. Após aporte do governo de R$ 10,4 bilhões em abril deste ano, o resultado já pode ser notado: em sete meses, o Fundo aprovou R$ 7,3 bilhões para operações, mais que o dobro dos recursos distribuídos em dez anos de programa (R$ 3 bilhões entre 2013 e 2023).

Conclusão: o cooperativismo conectado ao pós-COP29

Conclusão: o cooperativismo conectado ao pós-COP29

Sempre protagonista nas COPs por levar seus projetos e exemplos de sucesso ao mundo, o cooperativismo brasileiro também será impactado pelos novos avanços e pelos desafios da ação climática global.

A criação do mercado internacional de carbono representa uma oportunidade para o setor. As operações intermediadas pela ONU tendem a aumentar a demanda por créditos de carbono e facilitar a entrada de capital estrangeiro no Brasil. Assim surge mais um motivo para as cooperativas acreditarem na viabilidade financeira de projetos sustentáveis.

A regulamentação do mercado nacional também é um passo decisivo para a expansão do segmento. Ao estabelecer marcas de emissões que podem acarretar em multas e sanções se ultrapassadas, o governo promove o aumento da demanda por créditos de carbono.

Setores específicos certamente precisam ficar atentos às repercussões da COP29. Para que o Brasil alcance a meta de redução das emissões de carbono apresentada em sua nova NDC, o país irá elaborar metas setoriais. 

A previsão é que isso aconteça no início de 2025, com a elaboração do Plano Clima, que promete contar com a participação da sociedade civil. Os segmentos econômicos, incluindo do cooperativismo, devem participar de maneira ativa nessas definições.

Um longo caminho rumo ao 1,5ºC

Todas as discussões nas COPs, os projetos elaborados pelo governo brasileiro e as ações sustentáveis de cooperativas têm um objetivo comum: limitar o aquecimento global a 1,5ºC em comparação aos níveis pré-industriais, temperatura listada no Acordo de Paris como limite para mitigação dos efeitos da crise climática.

Entretanto, assegurar o cumprimento dessa meta não será simples. O acordo global de financiamento climático estabelecido na COP29 mostra que ainda há dificuldades para se mobilizar recursos e promover ações transformadoras em prol do meio ambiente.

Alcançar o objetivo só será possível com atuação de indivíduos, organizações e governos. As COPs sempre são oportunidades para promover avanços na direção correta, e o Brasil estará em posição privilegiada para fazer a diferença no ano que vem.